quinta-feira, 28 de junho de 2012

[Resenha] A contribuição dos Parques Infantis de Mario de Andrade para a construção de uma pedagogia da Educação Infantil. FARIA, Ana L. G.

Parque infantil

O artigo de hoje foi elaborado com base em trecho extraído da  tese de doutorado de Ana Lucia Goulart de Faria. Nele, a autora apresenta os Parques Infantis criados por Mario de Andrade como espaços privilegiados de atendimento e cuidado das crianças filhas de trabalhadores. Criados pelo poeta quando de sua gestão como secretario de cultura do município de São Paulo em 1935; foram projetados para receber crianças de 3 a 12 anos e tinham o objetivo de possibilitar a vivência da infância em toda sua especificidade e completude das brincadeiras, da arte, do folclore e do imaginário. Tendo em vista a construção de uma pedagogia da educação infantil que considere essas dimensões, FARIA pretende tecer considerações a cerca das propostas realizadas com as crianças em idade pré-escolar de 3 a 6 anos.
Parque infantila Parque infantilb
A primeira imagem ilustra um Parque Infantil imediatamente após sua criação; a segunda (à esquerda) retrata a visita de Mário de Andrade ao Parque Infantil Dom Pedro II e a terceira (à direita) é uma foto da EMEI Neyde Guzzi de Chiacchio, ainda em funcionamento, localizada no bairro da Lapa (zona oeste de São Paulo).
Abraços,
Lorena Oliveira
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Resenha
Considerados como precursores da educação infantil na cidade, os Parques Infantis, embora não-escolares, foram as primeiras experiências brasileiras na esfera pública para o atendimento de crianças pequenas. Em seu contexto as crianças eram vistas como seres plenos produtores de cultura, assegurando-lhes o direito a educação, a assistência e a recreação; diferentemente da proposta elaborada para a criação da rede municipal de educação infantil de São Paulo em 1974. Nesta o cuidado e a educação foram separados, passou-se a entender a criança como ser dependente, passivo que apenas consome cultura.
Partindo da dificuldade de se estabelecer uma proposta de prática para os espaços de educação infantil que garanta a criança a vivência de sua infância, o conhecimento provocado pelo movimento do corpo no mundo, a apreensão de diferentes modos de expressão e organização da realidade a partir das brincadeiras, da imaginação, e das várias linguagens artisticas; a autora propõe a investigação de outros espaços que, tais quais os Parques Infantis, levem em conta a criança e suas cem linguagens.
Em outras palavras, trata-se de construir um referencial que nos permita pensar o termo educação sem relacioná-lo a ideia de escola. Ao invés da antecipação dos estágios de aluno, posterior adulto, as crianças frequentadoras dos Parques Infantis conviviam com outras crianças, de diferentes idades e adultos, relacionando histórias e produzindo culturas. Entendia-se que a partir do reconhecimento do folclore próprio destes grupos, dos jogos e brinquedos tradicionais, das diversas formas de expressão artística; como fins em si, enquanto formas de produção cultural e conhecimento humano, e não como meios para a aquisição de determinados conteúdos; permitia-se as crianças, filhas das classes populares de São Paulo que vivenciassem sua infância.
Nas palavras de Mario de Andrade,
“(...) temos enorme necessidade de escolas primárias e de alfabetização. Mas a organização intelectual de um povo não se processa cronologicamente, primeiro isso e depois aquilo. (…) Não entreparemos portanto no sofisma sentimental do ensino primário. Ele é imprescindível, mas são imprescindíveis igualmente os institutos culturais em que a pesquisa vá de mãos dadas com a vulgarização, com a popularização da inteligência.” ( apud FARIA, 1999, p. 66)
Ao tratar da especificidade do folclore, entendido por ele como forma de conhecimento no qual se agregam a história e as particularidades de um determinado agrupamento social, o autor é contundente em dizer que muito se distância da realidade cultural manifesta pelo folclore o que a elite entende e transmite como sendo “folclórico”1. Grande colecionador de desenhos infantis, sobre as artes e a infância, também discorda da vertente teórica da antropologia da época que propunha que a ontogênese poderia ser lida como reprodução da filogenese. Para Mario a arte da criança não se produz de modo espontaneo, como cópia ou manifestação de um estado latente; acontecendo a partir da apropriação que a criança faz das diversas formas expressivas e do seu entorno. Entendendo o desenho como linguagem que antecede a escrita ele nos diz que “(...) pelo que sabemos da criança até agora, que até um certo ponto abandonado os fatores estimulantes, a criança realiza por sua conta e risco, pela sua própria experiência, um, não o, mas um nascimento do poder humano a representação figurativistica.” (ANDRADE, 1966, apud FARIA, 1999, p. 73); salientando que é a partir da acomodação às práticas sociais da linguagem e à alfabetização realizada pela escola que a criança para de desenvolver esta forma de expressão.
Para concluir, convém ressaltar que sendo projetados para garantir o atendimento as crianças oriundas da classe operária e embora tenha sido analisado também como espaço de disciplinamento social, os Parques Infantis tinham o intuito de reconhecer e valorizar a cultura própria das classes populares, entendendo que estas, assim como as demais, fazem parte da constituição da cultura e do povo brasileiro. Para o autor “O diferente é um outro2, que faz parte do conjunto da população que constrói a identidade nacional.” (FARIA, p. 76)
Deste modo, ao se referir as concepções educacionais que embasavam o projeto de modernização do autor, FARIA nos diz que “A sua preocupação com o outro, com a construção da identidade cultural brasileira, através de uma linguagem poética, não-acadêmica, permite alcançar para a área da educação novas dimensões de que ela urgentemente necessita.” (FARIA, p.77)
Notas
1“Na verdade este “folclore” que conta e livros e revistas ou canta no rádio e no disco as anedotas, os costumes curiosos, as superstições pueris, as músicas e os poemas tradicionais do povo, mais se assemelham a um processo de superiorização social das classes burguesas.” (ANDRADE, 1949, p. 285-286 apud FARIA, 1999, p.69) 2Sobre a Educação, referindo-se a Mario de Andrade: “ _______________________________________________________________
O artigo completo está disponível na Revista Educação & Sociedade
Fonte de Imagens
A primeira está no site da Revista UFG
A segunda a esquerda no site da UNICAMP
A terceira a direita no blog Histórias da Lapa do jornalista Eduardo Fiora










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