segunda-feira, 20 de agosto de 2012

[Resenha] IX. O PROFESSOR. READ, Herbert.


kandinsky_black-violet Boa noite amigos! Hoje tem leitura obrigatória no blog. Trago a resenha do cap. IX. O PROFESSOR extraído do livro A educação pela arte de Herbert Read. Escrito na década de 1940 traz importantes reflexões para os interessados nas áreas de arte-educação. Embasado pelos escritos do filósofo e pedagogo Martin Buber, neste capítulo são discutidas as funções e sentidos da prática docente, tendo em vista a concretização do projeto que pretende a arte como fundamento da educação. As imagens são de Wassily Kandinsky, pintor russo que gosto muito, de quem estou lendo Do espiritual na arte. Em breve trago ele aqui. Boa leitura!
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Abraços,
Lorena Oliveira
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Resenha
IX. O PROFESSOR
READ inicia este primeiro momento do capítulo salientando o fato de não ter sido professor, sendo suas considerações sobre o ensino advindas da observação e da reflexão externa; particularmente embasadas pela filosofia de Martin Buber. Para este autor, tendo em vista suas considerações sobre a temática da criatividade, “Existe em todos os homens um claro impulso a fazer coisas, um instinto que não pode ser explicado por teorias da libido ou da vontade de poder1, mas é desinteressadamente experimental.” (p.318) ressaltando que nos processos educativos, “(...) não é o livre exercício do instinto que importa, mas a oposição que ele encontra.” (idem) De modo que a educação se da em um processo de comunhão, um processo em que a necessidade do outro torna-se inerente; uma vez que o instinto criativo operando em um mundo passivo criaria apenas coisas objetivas e externas a partir de uma energia que sai do indivíduo e se dilui na coisa criada, tornando-nos figuras solitárias. Nas palavras de BUBER,
“É só quando alguém o toma pela mão, não como 'criador' mas como camarada, amigo ou amante, que ele experimenta uma reciprocidade íntima. Um sistema educacional construído unicamente sobre o instinto de originar provocaria um novo e dolorosíssimo isolamento do homem.” (idem)
Neste sentido, ao distinguir a criatividade como impulso específico a ser originado de uma espontaneidade mais geral, o autor coloca sua importância como precondição para a educação; salientando que o professor não deve confundir a necessidade de não reprimir a espontaneidade infantil, com o laissez-faire que acaba por se tornar vazio2. Há que se considerar que a criança aprende “Por sua própria experiência, mais o esclarecimento que recebe em seguida, [de modo que] ela é verdadeiramente educada e adquire uma consciência reverente da natureza do objeto.” (ibidem, p.319) Onde
“As disposições que, se fosse possível analisá-las, encontraríamos na alma de uma criança recém-nascida não passam de aptidões para receber e conceber o mundo exterior. O mundo engendra a pessoa no indivíduo. Assim, o mundo – todo o meio ambiente, a natureza e a sociedade - “educa” o homem: desenvolve suas potencialidades, permite-lhe responder ao mundo e ser convencido por ele. O que chamamos de educação, consciente e voluntária, significa a seleção de um mundo exequível pelo indivíduo – significa dar força diretiva a uma seleção do mundo feita sob a orientação do professor.” (ibidem, p.320)
Refletindo sobre as relações estabelecidas entre mestres e aprendizes, anteriores a uma distinção específica entre professores e alunos, READ valoriza as pequenas atitudes do professor de modo que sua “seleção de um mundo exequível”, construída a partir “de sua própria colheita de experiência”, não se imponha ao aluno. Este deve ser construído a partir da equação experiência mais orientação. Neste contexto, BUBER sugere, tendo em vista a dialética negativa,
“(...) que a antítese da compulsão [ato de compelir ou forçar] ou coerção não é a liberdade, mas a comunhão [harmonia; acordo] ou apego. (…) Coagido pelo destino, pela natureza, pelo homem – o oposto a esses estados não é estar livre do destino, da natureza ou dos homens, mas estar unido a eles.” (ibidem, p.321)
Em outras palavras, READ considera que a vida enquanto percurso, pode ser entendida como diálogo que se estabelece entre as potencialidades inerentes aos indivíduos enquanto seres questionadores; e seus pensamentos, ações e práticas vistas como respostas a estas questões. Neste sentido, em acordo com os objetivos expostos ao longo do livro, ser professor pressupõe compreender sua condição enquanto sujeito responsável por iluminar caminhos para que seja possível aos alunos a construção de suas próprias respostas as questões inerentes a si. Em referência a BUBER, a prática docente, também entendida como processo criativo, deve ser desinteressada tendo em vista a negação anteriormente citada que refuta as ideias da vontade de poder e da vontade de prazer. Assim, “(...) se ele for um verdadeiro professor, não começará a dividir e classificar segundo suas inclinações e preferências.” (ibidem, p.322)
Para o autor, as relações que se estabelecem entre professores e alunos devem estar embasadas em termos de envolvimento e não de empatia. De modo que se estabeleçam laços que longe de funcionarem a partir da lógica de identificação “(...) total com os sentimentos ou a situação de outra pessoa. Significa experimentar o dar e receber de uma relação mútua, tanto de nossa parte quanto da parte da outra pessoa, e ao mesmo tempo.” (ibidem, 323) Há que se considerar, no entanto, o paradoxo que se impõe ao professor, sendo ele capaz de visualizar a relação professor – aluno de ambos os ângulos. Assim, “É porque sempre deve haver um elemento unilateral nesta relação mútua que o “envolvimento” da relação pedagógica permanece distinto do que é encontrado na amizade.” (ibidem, p. 324) Considerando ainda a inerência da condição que torna as relações educacionais processos de via dupla onde os professores ao mesmo tempo em que ensinam, encaminham, são encaminhados, são também educados em relação a vida e suas práticas cotidianas.
Referindo-se a tese defendida ao longo do livro, READ coloca a necessidade de que a função do professor, segundo definida por BUBER; seja levada em consideração para que a proposta da educação pela arte possa ser concretizada; salientando sua condição orientadora e seletiva de modo que “O “eu” seletivo do indivíduo é substituído pelo “você” seletivo do professor. O indivíduo apreende seu meio ambiente através de uma tela seletiva, e o padrão desta tela, que determina o que entra e o que é excluído, é o padrão social.” (ibidem, p. 327) Para READ, o conceito de professor defendido por BUBER supera a ideia que coloca o educador como opositor que impõe processos, tornando-o agente compreensivo de unificação entre as instâncias individuais e coletivas.
Para concluir, o autor retoma o fato de não ser professor, tendo construído suas considerações a cerca da função do professor nos processos de ensino e aprendizagem a partir da observação desinteressada de uma grande quantidade de aulas de arte em diversas escolas. Destas resultou a impressão perturbadora (segundo suas palavras) de que “(...) os melhores resultados não podem ser correlacionados com qualquer sistema de ensino ou quaisquer qualificações acadêmicas do professor.” (ibidem, p. 328) Assim, pode-se concluir que a educação e o sucesso dos processos de comunhão inerentes a ela; dependem, entre outras coisas, da criação, por parte do professor, de uma atmosfera de compreensão que possibilite a todos os envolvidos trilharem seus próprios caminhos dialógicos de questionamento e resposta perante a natureza, o meio ambiente e os próprios homens.
Notas
1Em referência as teorias de S. Freud e F. Nietzsche.
2“(...) essas modernas teorias da educação que enfatizam a liberdade não percebem a importância da função do professor, enquanto que as que se baseiam no princípio da autoridade negligenciam a importância da outra metade (a atividade experimental da criança).” (p.320)
Referência Bibliográfica READ, Herbert. A educação pela Arte. Trad. Valter Lellis Siqueira. São Paulo: Martins Fontes, 2001. (p. 317 -328)
Fonte de Imagens












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