segunda-feira, 20 de agosto de 2012

[Resenha] O pensamento na arte contemporânea. RAJCHMAN, John.

Beatriz Milhazes_born_a Uma boa tarde aos companheiros de caminhada que por aqui estiverem ou passarem. A resenha de hoje foi elaborada a partir do artigo de John Rajchman, professor do departamento de História da Arte e Arqueologia da Universidade de Columbia – EUA, traduzido por Alberto Rocha Barros;  propõe refletir sobre a especificidade da arte contemporânea, tendo como pano de fundo as teorias histórico culturais para as quais a arte é sempre fruto de seu tempo. Neste sentindo, ao considerar-se a abundância de pesquisas e diferentes produções artísticas características de nosso tempo, o autor parte da ideia de que “(...) não há arte – e, particularmente, não há 'arte contemporânea' – sem uma busca por novas ideias do que seja a arte e de suas relações específicas (…) com o próprio pensamento.” (p.97)
Vale a pena ser lido por dar uma “clareada” nas profusão de ideias a cerca da arte contemporânea e suas relaçoes com o pensamento. Como não poderia deixar de ser, as imagens que ilustram esta postagem são dos artistas brasileiros contemporâneos: Beatriz Milhazes, Vik Muniz, Ernesto Neto e Adriana Varejão respectivamente.
Beatriz Milhazes_mulatinho_a   Beatriz Milhazes_b
vik muniz_a   vik muniz_c
ernesto neto_b  ernesto neto_a
adriana varejo_b   adriana varejo_c
Abraços,
Lorena Oliveira
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Resenha
RAJCHMAN inicia este trabalho salientando o objetivo de aprofundar a problemática referente “as ideias de arte” e as “ideias na arte”, entendidas como possibilidades de reconstrução do pensamento nas artes. Assim, o autor, coloca a importância de dar-se atenção às vozes dos artistas, de modo que seja possível compreender e ampliar a especificidade do pensamento artístico em suas relações com as diversas áreas do conhecimento humano1. Espera-se aprofundar as discussões que colocam a necessidade de superarmos, no campo da arte, a concepção didática na qual se “utiliza” a arte como meio para ilustrar uma teoria; e a concepção “romântica” que a define como produto do que “não se pode dizer de outra forma”.
Tendo em vista o contexto histórico no qual tais ideias se desenvolvem e seu papel fundamental nestas elaborações; são retomados contextos nos quais as ideias de arte foram moldadas segundo cânones institucionais, e também àqueles nos quais houve um afastamento crítico em relação a institucionalização. Em suas palavras
“Kant moldou as relações entre a arte e o pensamento de uma maneira nova2 (…) Nesta história, as instituições são relevantes. Ao mesmo tempo, algumas ideias carregam consigo um afastamento crítico violento em relação a institucionalização (e especialmente à “academização”), assumindo formatos como o do “coletivo” ou do grupo de vanguarda, com seus periódicos, seus critérios próprios e sua visão do futuro da arte.” (p.98)
Dito isto, o autor apresenta três teses recorrentes sobre o que é “arte contemporânea”:
    Tese I: A arte contemporânea é “pós-suporte”
Tradicionalmente definida como oposição a arte moderna ou ao modernismo, surgiu em 1960-70, particularmente em Nova York; também conhecida como “o fim da arte”; “pós-modernismo”, “neovanguarda”, etc. Diz o autor que
“Para nossos propósitos, também pode ser retratado como o momento no qual a ideia de arte se libertou de uma série de amarras e distinções, convenções e hábitos que se prendia – dos suportes tradicionais da pintura e da escultura e das “habilidades” a eles relacionados; da produção em estúdio e das exposições nos assim chamados cubos brancos; das divisões que separavam a alta arte da arte comercial ou de massa (ou da cultura popular ou vernacular); e daqueles que distinguiam arte e vida cotidiana, ou arte de informação e documentação e seus aparatos de reprodução e recepção, ou arte e linguagem da crítica e da teoria.” (p. 99)
Há também que se considerar a predominância das artes visuais neste movimento de expansão e quebra de paradigmas onde “(...) vemos também a invenção de muitos estilos, novos modos de fazer filosofia, novas relações com as instituições, seus dramas e suas pressuposições (…)” (idem). Surgem as instalações e o teatro performático cujos objetivos buscam o estabelecimento de relações para além da mera exposição de objetos para um público. Citando Thierry de Duve, coloca-se a perspectiva na qual a arte contemporânea representa a passagem do questionamento sobre o belo na arte para a reflexão sobre “o que é arte”.
Para RAJCHMAN todas estas concepções não colaboram para dizer o que realmente é o pensamento na arte contemporânea e suas potencialidades, resultando em um empobrecimento de sua condição, uma vez que são constantes as relações que se estabelecem entre ela e adjetivos pejorativos, chegando-se mesmo a morte da arte. Nas palavras do autor, “(…) essa abordagem serve para obstruir a tarefa, a um só tempo filosófica, artística e histórica, de identificar novas ideias nesse complexo, inserindo-as em novas histórias ou sequências, associando-as a novos campos, tarefa que nos permitiria olhar para o trabalho desse período de novas maneiras.” (p.100)
Neste sentido, coloca-se ainda a necessidade de superação das concepções e práticas abstracionistas, características do modernismo, segundo as quais toda arte deve confrontar seu suporte principal objetivando anular a ascensão do kitsch3. Em uma redescoberta do passado, termos e ideias como “participação” ou “interação”4, “instituição” e “público” devem ser revistos e ampliados com o objetivo de “(...) “tornar visível” aquilo que não podemos enxergar por causa da terrível máquina de obviedades que regula aquilo que estamos acostumados a ver e a pensar cotidianamente (...)”; para além de seu emprego empobrecido em relação a especificidade da arte contemporânea. Para o autor, “Dessa maneira, talvez possamos preservar na noção de “ter uma ideia” o elemento de questionamento que empurra sentidos ou hábitos institucionais a um “exterior” onde não existem regras sociais próprias.”(ibidem, p. 101); de modo a possibilitar a emergência de novas formas de ver e vivermos no mundo.
Tese II: A arte contemporânea é a arte da “globalização” da arte e de suas instituições
Segundo esta tese “A arte contemporânea é a arte que ou “reflete” ou “resiste” a essa nova “formação” pós industrial do capital ou do Império ao qual serve.”(p.102). Para RAJCHMAN o problema de tal definição consiste no fato de se atribuir à arte responsabilidades e funções por demais externas a ela; citando como exemplo a ideia romântica de revolução que nunca se dá por si só apenas impulsionada pelos ideais e concepções expressas pela arte. Assim, o autor considera a necessidade de aprofundar, mesmo que de modo breve, o entendimento do que seja a globalização e a análise critica em seu contexto.
Citando Etienne Balibar5 propõe refletirmos sobre os aspectos geográficos na arte contemporânea; temas como deslocamento, exílio, nomadismo, as instituições globais e as locais, as novas formas como mapas são interpretados; e ainda o “turismo” e a expansão das bienais de arte em diferente capitais mundiais; tornam-se constantes em diversas produções artísticas. Neste sentido, pergunta-se o autor, qual o papel que esta temática representa na construção da ideia de “cidadania transnacional”? Em suas palavras
“Para responder a essa questão precisamos nos afastar dos velhos problemas do que é o “outro ocidente”, do esquema “centro e periferia” e das velhas (e um tanto vazias) ideias sociológicas de “modernidade versus tradição”. Nas novas zonas geográficas da arte (…) é mais útil imaginar transplantes e trocas em torno de “ideias de arte” (…) que migraram e se transformaram nesses novos lugares, ao confrontarem-se com outras práticas.” (p. 103)
Dito de outro modo, o contexto geográfico também influencia a arte, não somente ao oferecer paisagens e materialidades mas possibilitando a construção do que se pode chamar de um “modelo de camadas sobrepostas” da globalização.
Tese III: A arte contemporânea é uma arte sem transgressão
Neste ponto o autor retoma a ideia defendida por àqueles para quem não pode haver arte sem transgressão; considerando-a uma forma ainda mais conservadora de propor a morte da arte e todos os aspectos negativos que esta ideia denota. Deste modo chama atenção para o fato de a arte contemporânea não ser mais a negação sonhada por Adorno, mas sim o que se pode chamar de afirmação de materialidades e da amplitude de possibilidades proporcionadas pelo engenho das novas tecnologias e do pensamento humano. Salienta-se, no entanto, a não condição dicotômica que toma estes aspectos somente a partir do empobrecimento negação x afirmação. Assim, diz o autor que
“(...) Deleuze e Foucault insistiram em tentar derrubar a grandiosa figura do Transgressor como sacerdote ou “soberano”, como condição do pensamento crítico ou da arte, substituindo-a pela ideia de uma grande Ordem Simbólica que é Transgredida, de uma intuição para os dispositivos concretos que governam a suposta “autoevidência” daquilo que vemos e dizemos, e as novas forças que rompem com eles, permitindo a experimentação com outras possibilidades (…) Como no caso das teses previamente apresentadas, a questão de ter ideias, de pensar nas e com as artes, oferece uma maneira de colocar o problema, oferecendo novas caminhos para dentro e para fora da divisão moderno – contemporâneo.”(p.105)
Para RAJCHMAN as relações que se estabelecem entre o pensamento e o“ter ideias” nas, com e através das artes; colocam-se como questões fundamentais para a arte contemporânea de modo a afirmar sua potencialidade não “(...) como modelos “didáticos” da relação entre problemas filosóficos e ideais, mas quando eles despertam e dão vazão as novas maneiras de pensar.” (idem) Para concluir, dos possíveis encontros entre arte e filosofia, destaca a condição inerente a ambos enquanto gatilhos de “(...) “desaprendizado” daquilo que nos foi dado a conhecer e ver, um tipo de “desidentificação” com formas dadas de falar e ver (…) em direção ao frescor de outras formas de fazer as coisas.” (ibidem, p.106)
Notas
1“Deleuze oferece um exemplo dessa abordagem quando coloca o problema da “imagem” no cinema – de como os grandes cineastas “tiveram ideias” em cinema, ideias que, por sua vez, serviram para fazer convergir muitas mudanças políticas e técnicas, bem como algumas questões filosóficas sobre tempo e duração, e também o modo pelo qual nele “aparece”, ou pelo qual ele “nos mostra” nossas vidas nos forçando a pensar nela.” (p.98)
2 Ao inventar a disciplina estética, distinta da história da arte e da apreciação artística.
3“1. diz-se da ou manifestação cultural ou artística que explora estereótipos sentimentalistas, melodramáticos ou sensacionalistas.” Dicionário de Língua Portuguesa. Porto Editora.
4Encontradas “(...) por exemplo, naquelas tradições teatrais que buscaram estabelecer um contraste entre a contemplação ativa e a contemplação passiva e o espaço de contemplação.” (p.101)
5“(...) distinguiu quatro diferentes modelos de globalização, em um ensaio em que tenta desenvolver a noção de que existe uma dimensão territorial ou espacial irredutível da própria política, contra a qual poderíamos medir as tentativas de criar uma “cidadania transnacional”.” (p. 103) Referências
O artigo completo está disponível Aqui
Imagens: Google Imagens





























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