segunda-feira, 20 de agosto de 2012

[Resenha] “Experiência poética e linguagem plástica na infância.” Sandra Richter.

van gogh_flores azuis   anita malfatti_ jarro de flores
paul klee_flores     tarsila do amaral_flor de manaca    
romero brito_ flor
Aos amigos que por aqui estiverem uma boa tarde! Hoje trago-lhes as reflexões de Sandra R. S. Richter originadas junto ao grupo de estudos Educação e Arte da Universidade de Santa Cruz do Sul e plasmadas (termo por ela utilizado), no artigo “Experiência poética e linguagem plástica na infância”. Seu objetivo ai foi discutir as aproximações dos campos da arte e suas linguagens plásticas; e da educação.
Sandra Richter propõe a quebra de paradigmas no ensino de arte uma vez que seu objetivo não é a acumulação e transmissão de conhecimentos e técnicas. Para a autora a experiência poética possibilitada pelo fazer arte consiste em uma experiência formativa dada sua condição de criação que apreende e constrói diferentes formas de se compreender o mundo.
Desta forma, ficam as imagens, plasmadas por Vincent Van Gogh, Anita Malfatti, Paul Klee, Tarsila do Amaral e Romero Brito respectivamente; a sugerir suas diferentes formas de ver e conceber o mundo e nele as flores.
Abraços de coisas boas,
Lorena Oliveira
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RICHTER, Sandra.
Experiência poética e linguagem plástica na infância.
Resenha
Nesta comunicação originada a partir dos estudos realizados junto ao Grupo de Estudos Educação e Arte da Universidade de Santa Cruz do Sul; a autora propõe a aproximação dos campos da arte e da infância. Em consonância com a ideia de integralidade dos indivíduos, questiona-se a dicotomia que permeia a reflexão e as formas de ação em ambas as áreas “(...) no conflito permanente que a racionalidade teórica mantém com o universo imagético-sensível e a diversidade de seus modos de acontecer – e aparecer – seja na infância, seja nas primeiras figurações.” (p.1)
Longe de propor uma reflexão pautada na ideia do ensino tradicional de arte, cujo objetivo é a transmissão de conteúdos e a apreensão de técnicas de transformação de diversas materialidades, Sandra RICHTER considera que
“Investigar processos de aprender a configurar imagens através do desenho, da pintura, da modelagem e da construção de objetos na infância implica acolher a imprevisibilidade e o modo direto do movimento dos corpos no e com o mundo: o inusitado da admiração diante do poder de transformar materialidades e gestos enquanto transfiguração do visível.”(p.1)
Mais do que ensinar e aprender, trata-se de um encontro entre a especificidade da criança e a do adulto; da troca de experiências e conhecimentos entre corpos que conhecem e acontecem no mundo de modos diferentes. Sem a valoração normativa adotada pela lógica racionalista, manifesta através das teorias psicológicas do desenvolvimento biológico e cognitivo; onde cabeças e corpos são separados e atribui-se maior valor aos conhecimentos advindos dos processos ditos objetivos; é possível que o educador aprenda com as crianças que o insubstituível na experiência com as linguagens artísticas
“(...) não é tanto sua dimensão artística e nem sua dimensão estética, mas a antiga e esquecida dimensão poética que advém do encantamento de um corpo diante das primeiras admirações com a plasticidade do mundo que convocam o corpo infantil a “mexer-se” e lançar-se em imagens e palavras para aprender a decifrá-lo e interpretá-lo no ato de narrar e encenar – através de seus jogos e brincadeiras – o extraído dessa experiência de comunhão entre corpo, linguagem e mundo.” (p.2)
Desta forma, pode-se dizer que para a criança, a experiência poética ocorre constantemente; no ato cotidiano de perceber-se como feito pelo mundo e “fazedor” dele. Para elas, a organização da realidade acontece a partir de linguagens que precedem a organização elaborada das palavras; sendo então, desafio do educador,
“(...) abarcar que repertórios linguageiros não se fazem por acumulação de informações estanques mas por transfiguração – ou metamorfose – enquanto ato vigoroso de aprender a dinamizar corpo, imagem e palavra no ato mesmo de conquistar outro movimento no mundo ao romper com obstáculos sedimentados por atos de pensamento.”(p.4)
Retomando o objetivo inicial desta exposição, qual seja o de refletir sobre a aproximação das linguagens artísticas, mais especificamente das linguagens plásticas, da infância; a autora propõe, embasada “(...) nas fenomenologias da imagem de Bachelard, do corpo em Merleau-Ponty e da ação em Ricouer, outro olhar às imagens realizadas por crianças pequenas.” (p.5) De acordo com ela é preciso dar visibilidade aos pequenos e inusitados detalhes para que se compreenda a comunicação infantil ainda não “engessada” pela dicotomia corpo e mente, e pela supervalorização da linguagem verbal em detrimento das diversas linguagens plásticas e artísticas. O próximo ponto no qual se debruça sua reflexão, diz respeito as elaborações imagéticas materializadas no desenho, na pintura, na modelagem, na construção de coisas; RICHTER nos diz que
“Imagens desenhadas ou pintadas, modeladas ou construídas, modificam nossa relação com as coisas, com o mundo, com o corpo. A atitude laboriosa que envolve o ato de desenhar, pintar e modelar, assim como construir objetos, não é apenas um passatempo que promove a evasão do real a partir da livre imaginação e tampouco se reduz a um meio para “adquirir” conhecimentos. Implica em uma experiência de aprendizagem no sentido de formação1. Assim, diz respeito àquilo que nos faz ser o que somos ou, nos termos de Bachelard, àquilo que então nos tornamos a partir de nossos devaneios, do modo como imaginamos e ficcionamos para tornar inteligível a convivência, o existir junto. (…)
Contra o sendo pedagógico, não é o verbo que mobiliza ações e transformações na infância. É a experiência sensível do corpo e o movimento afetivo das mãos que tocam a materialidade do mundo para daí extrair-se um e-movere – a admiração, a interrogação, a investigação – que abole molduras estabelecidas por conhecimentos prévios. Um corpo estesiado, um corpo em movimento, um corpo linguageiro.(...)
O corpo que age, opera no mundo e o transfigura, tornando-o inteligível. A arte seria incompreensível se não des-arranjasse e não re-arranjasse nossa relação ao real. Aproximar o mundo, através de traços e manchas sobre uma superfície reduzida, é renunciar a sua imediaticidade pela tomada de distância, pela posse do redimensionando a relação sensível com as coisas e com o espaço que nos enlaça. Desenhar, pintar, modelar, construir objetos, isto é, trazer pelas mãos uma visão-imagem de totalidade e unidade daquilo que é disperso e impalpável, pela imensa distância que as grandezas impõem, amplifica a compreensão das coisas cativas no mundo pois permite tomar posse do intangível.” (p.6)
Dito de outro modo, a ação de descoberta do mundo empreendida pela criança é anterior ao verbo e manifesta-se através do corpo e de sua série de outras linguagens; a partir das quais, a criança, na medida em que modifica o mundo também vai se modificando ao apreender/ construir diferentes formas de elaborar a realidade. É pois, nesse constante modificar e modificar-se, pautado na capacidade de imaginar e construir dos indivíduos que nos tornamos quem somos. Desta forma, pode-se dizer que, contrariando o senso pedagógico cujo enfoque principal é o desenvolvimento racional expresso pelas palavras; quanto maior for a ampliação do repertório infantil, maior será sua capacidade de reordenar a realidade de modo crítico. Vistas por este ponto, ciência e arte partilham da mesma ideia de conhecimento do mundo, uma vez que ambas, consideradas suas especificidades, objetivam formas de elaboração, compreensão, entendimento, ordenação crítica da realidade; “(...) isto é, podem amplificar o real tanto no plano cientifico como no plano artístico ao permitirem passar do plano oculto ou intangível ao plano disto que é mostrado, tornado visível.”2 (p.6) Onde “O detalhe desafia o olhar panorâmico preguiçoso ao fazê-lo confrontar as estranhezas do mundo familiar. A surpresa e o espanto coloca-nos diante de um outro mundo, nos faz aprender que visto pela imaginação, o mundo é mutável.” (p.8)
RICHTER ressalta a importância e a necessidade de relacionarmo-nos no mundo com mais vagar. Dar atenção aos detalhes da existência, assim como as produções infantis que se inserem nela, seriam modos de retomar a dimensão, cada dia mais distante, da experiência poética. Olhar com vagar produz transformações que geram formações e não o simples acumulo de conhecimentos, para a autora
“A interlocução entre as fenomenologias da imagem, do corpo e da ação permite afirmar que o modo como imaginamos é mais instrutivo – ou formativo – do que aquilo que se imagina. Não para “adquirir ou acumular conhecimentos” mas para aprender outros modos de plasmar sentidos. (…)
Tal expansão nos torna flexíveis ao mundo pois passamos a explorar e investigar sua constante metamorfose: entramos no movimento do mundo. Brincar é uma atitude, uma disposição lúdica de desarranjar e rearranjar as coisas. É desperdício, tensão, excesso, exagero, que desestabilizam a ordem e nos convocam a inventar outra ordem.” (p.12-13)
Dito isto, pode-se concluir, quanto a urgência de se pensar a dimensão formativa da arte na infância, que em tempos de aceleração das informações e valorização exacerbada dos modos de conhecer o mundo relacionados a racionalidade e a objetividade; as crianças (em especial) vem perdendo o direito e o espaço para realizarem suas individualidades uma vez que suas formas de comunicação, interação, exploração e criação do mundo são especificamente construídas da admiração e da alegria de um corpo aprendendo a operar diferentes linguagens [plásticas] para redescrever o vivido e assim aprender a reinventar-se: embora diverso, sábio ou poeta, o humano não é dado, torna-se” (p.15)
In GE: Educação e Arte/n. 01
Agencia financiadora: FAP/ UNISC
Notas:
1“(...)experiência de aprendizagem no sentido que Bachelard lhe dá: um trabalho simultâneo sobre o mundo e sobre si onde ambos transformam-se, portanto no sentido de formação.” (p.4)
2“A constatação bachelardiana torna-se enigma em Dagognet (1973, p.XI): o pintor, apesar de restituir aparentemente o real, o encerra em um espaço mínimo sem o diminuir, pelo contrário “ele o amplifica e o intensifica. Encontramos mais sobre a tela que na imensa natureza”. Como o menos pode ser mais? Este é o enigma da iconicidade figurativa e que Dagognet (idem, p.56) denomina de “aumento iconográfico” para destacar que pintar não é substituir ou apresentar uma equivalencia do mundo mas portá-lo de inteligibilidade.
As formas plásticas amplificam a sensualidade matérica por reunirem valores de visualidade capazes de capturarem imagens e ideias deflagradoras de experiências sensoriais (...)” (p.7)
Referências
Para ler: o texto de Sandra Richter na integra está disponível AQUI
As imagens foram retiradas da internet.



















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