Bom dia aos que por aqui estiverem ou passarem. Seguindo a trilha, cujo objetivo seja aproximar o mais possível a vida das práticas profissionais como docente, além de ampliar as possibilidades de ordenação critica da realidade; continuamos refletindo sobre a arte como campo de conhecimento. Este capítulo foi escrito por Janine Moreira e está publicado no livro Educação e arte: as linguagens artisticas na formaçao humana. Nele a autora propõe a aproximação da pesquisa científica dos modos de conceber, conhecer e ordenar o mundo oriundos das práticas estéticas e artísticas.
As imagens são produções do senhor Pablo Picasso. Escolhidas pela capacidade de sugerir a ideia de diferença complementar. Arte e ciência são modos específicos de conhecer e ordenar a realidade que se complementam ao atribuir significado a uma dada situação cuja premissa seja o acesso, resgate, manutenção dos estados de beleza e encantamento com a vida.
Beijos e abraços,
Lorena Oliveira
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Resenha
“A ciência é um meio indispensável para que os sonhos sejam realizados. Sem a ciência não se pode nem plantar nem cuidar do jardim. Mas há algo que a ciência não pode fazer. Ela não é capaz de fazer os homens desejarem plantar jardins. Ela não tem o poder de fazer sonhar. Não tem, portanto, o poder de criar um povo. Porque o desejo não é engravidado pela verdade. A verdade não tem o poder de gerar sonhos. É a beleza que engravida o desejo. Sãos os sonhos de beleza que tem o poder de transformar indivíduos isolados em um povo.” (Alves, 2004, p.26 apud MOREIRA, 2008, p.13)
Neste capítulo, são objetivos da autora: refletir e aproximar a prática científica das experiências estéticas, bem como discutir e relativizar a primazia das ciências na produção e aquisição do conhecimento. Tendo em vista o humano que acontece, não somente em situações formais, com regras e disciplinas rígidas; mas também (e principalmente) nas belezas cotidianas da vida, no som, nas imagens, em gestos e afetos, MOREIRA questiona-se quanto a insistência em se distanciarem estas esferas durante a produção de estudos científicos1. Afirmando que “A ciência é apenas uma das várias linguagens do mundo. E para que possa ela mesma ser grande, precisa dar espaço para outras linguagens, sob pena de definhar perante sua inócua pretensão de tudo compreender.” (p.14-15)
Desta forma,
“Cyntia Farina, ao relacionar práticas estéticas com práticas pedagógicas, diz que algumas práticas estéticas podem afetar o que há de institucionalizado em nossa forma de ser: 'A atenção as práticas estéticas poderia ajudar a pedagogia a problematizar e cuidar do que nos desestabiliza atualmente, não para estabilizá-lo ou reconduzi-lo, mas para experimentar com a produção de novas imagens e discursos na formação do sujeito” (p. 13)
Entendendo processo criativo como reelaboração individual do real, é possível afirmar que sua ocorrência se da cotidianamente, a medida em que os sujeitos estão constantemente (e nas mais diversas situações) reelaborando seus conhecimentos, informações e práticas. Frente ao desconhecido, um indivíduo cuja autonomia de pensamento tenha sido fomentada; com base em suas vivências pessoais, é capaz de reordenar seus conhecimentos de modo a construir uma forma de relação com esta realidade específica.
“Como nos diz Monica Fantin,
(…) pensar o processo criador é refazer, recriar, transformar... É pensar um processo no qual mais importante do que saber as respostas dos problemas é saber formular perguntas, descobrir problemas. E esse processo criador não fica restrito ao campo da arte e da prática estética, pois está presente na nossa vida, no nosso trabalho e nas nossas relações.” (p. 20)
Neste ponto, destaca-se a “ampliação de horizontes” proporcionada pela aquisição, reflexão e produção nas mais diversas linguagens artísticas; assim como a relação direta entre a abundância/ quantidade de referências e a potencialidade/ qualidade da elaboração criativa. Para a autora, quanto maior for a ampliação das capacidades expressivas dos homens, de modo geral; e de professores e pesquisadores em específico, menores serão as situações em que “Cobra-se o pesquisador no sentido de que utilize os referenciais teóricos clássicos, e ele, longe de dialogar com esses referenciais, fixa-se neles como se fossem couraças, não se criando, portanto, como autor.” (p. 20)
O não criar-se como autor pode levar a desvinculação do saber científico do saber cotidiano. Ser autor significa, entre outras coisas, atribuir significado, dentre os tantos possíveis, para uma dada situação; ressaltando que este “significado” é único, pessoal e intransferível. Sendo elaborado a partir das diversas vivências diárias de cada indivíduo. Repetir fórmulas e métodos, sem dialogar, afasta o indivíduo de uma significação que só ocorre a partir de uma determinada poética; de uma determinada forma de ver e viver no mundo. Neste sentido
“Alves faz um paralelo com o método científico, dizendo que ele, em demasia, pode devastar a inteligência ao produzir cegueira – apenas enxergar como real o que for considerado científico – e pode devastar o caráter – produzir intolerância e inquisição.” (Alves, 2004 apud Moreira, 2006, p.25)
Dito isto, como conceber uma forma de prática academica e produção científica, pessoal e intransferível, que não está distante da vida e de seus saberes e movimentos cotidianos? A título de hipótese a autora nos deixa a reflexão quanto a ampliação das possibilidades de leitura, ação e reconstrução da realidade por parte do indivíduo; possibilitadas ou potencializadas pela prática reflexiva em arte. Aproximar os saberes da vida da acadêmia, pressupõe aproximar as pessoas, a poesia e as diferentes linguagens.
Notas
1“Demo (2003) aponta dois valores para a pesquisa, o científico – de produção do conhecimento – e o educativo – de instrumentação criativa para a emancipação, o aprender a criar, a pesquisa sendo um dos instrumentos essenciais da criação. Ele parte do princípio de que “em termos cotidianos, pesquisa não é ato isolado, intermitente, especial, mas atitude processual de investigação diante do desconhecido e dos limites que a natureza e a sociedade nos impõem.” (p.15)
In Educação e arte: as linguagens artísticas na formação humana. Campinas – SP: Papirus, 2008. (Coleção Ágere) (p. 11-26)
Fonte de imagens: Google.
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